De certa forma, ainda existe um paradigma na documentação fotográfica em Odontologia: apenas câmeras fotográficas profissionais seriam capazes de cumprir esse propósito com qualidade e durabilidade. No entanto, é cada vez mais evidente que os celulares vêm ganhando espaço nesse tipo de registro — e os motivos são claros. Smartphones são simples, intuitivos e portáteis. Essas características, por si só, já seriam suficientes para torná-los a primeira escolha para fotografias no ambiente clínico. Mesmo assim, muitos profissionais permanecem resistentes/inertes ao seu uso. O motivo? A crença de que celulares não têm qualidade suficiente para esse tipo de registro. Pelo menos, é o que muitos pensam.
Antes de qualquer coisa, procure pensar da seguinte maneira: a fotografia nada mais é do que o uso intencional da luz. O que quero dizer com isso é que o conhecimento da técnica fotográfica e do uso correto da iluminação deve preceder a aquisição de equipamentos — sejam eles profissionais ou não. Um indivíduo sem conhecimento suficiente sobre fotografia, mesmo que esteja equipado com uma Canon Mirrorless R100, lente macro de 100 mm e dois softboxes, não tem garantia de obter resultados satisfatórios. E o dentista que possui apenas um smartphone, um conjunto de iluminação adequado e muita técnica? Que resultados ele pode alcançar?


Mesmo aparelho, diferentes resultados…
Duas fotografias com um iPhone 11 utilizando técnicas fotográficas diferentes.
Domine a luz.
O que faz uma fotografia ser agradável para você? Aposto que a sua resposta provavelmente será: iluminação adequada. Antes de mais nada, é importante entender que existem dois tipos de luz: dura e macia.
A luz dura produz sombras bem definidas, com bordas nítidas, alto contraste e realce de texturas ou imperfeições. Sua principal fonte natural é o sol direto ao meio-dia. Na odontologia, pode ser útil para evidenciar irregularidades na superfície dentária e fissuras. Como desvantagem, tende a prejudicar o aspecto estético da fotografia, deixando a imagem excessivamente texturizada.
Já a luz macia — ou suave — cria sombras com bordas difusas, contraste reduzido e suavização de texturas. A luz solar em dias nublados é sua principal fonte natural.
Primeira dica: priorize a luz macia. Fontes artificiais, como placas de LED ou softboxes posicionados a 45°, ajudam a alcançar uma iluminação mais suave e agradável.




Faça um enquadramento certeiro.
Você sabia que qualquer imagem pode ser dividida em nove partes? Esse é o princípio da Regra dos Terços. Ao configurarmos o celular para exibir a grade, conseguimos visualizar essa divisão diretamente na tela, o que nos auxilia na composição fotográfica.
Quando bem aplicada, essa técnica pode transformar significativamente os resultados que obtemos. Os pontos de interseção das linhas — conhecidos como power points — são áreas naturais de interesse para o olhar.
Esse conceito se aplica perfeitamente à fotografia odontológica. Por exemplo, ao fotografar sorrisos, o quadrante central deve ser dedicado aos incisivos centrais e laterais, posicionados exatamente no centro da imagem. Sempre que possível, ative também a configuração de nível no celular para verificar se a inclinação do aparelho está paralela ao solo.



Quebre as configurações de fábrica
Nossos celulares vêm configurados, a nível de sistema operacional, para realizar pós-processamento (PP) de imagem nas capturas fotográficas. Basicamente, o PP utiliza aprendizado de máquina para selecionar automaticamente as configurações ideais de acordo com a iluminação do ambiente.
Em selfies, fotos em grupo ou paisagens, esse recurso é muito útil. No entanto, na Odontologia, buscamos justamente o retrato mais fiel possível da situação clínica observada no paciente.
Por isso, aqui vão duas alternativas para tentar “quebrar” as configurações de fábrica do celular:
- Zoom! – O sensor das lentes dos celulares é muito pequeno, o que faz com que a distância focal — ou a capacidade de capturar detalhes a uma determinada distância — seja considerada baixa. Essa distância, medida em milímetros, pode causar efeitos de distorção na imagem, como o chamado efeito barril. Para contornar esse fenômeno, podemos aplicar um zoom de pelo menos 2,5x, ajustando a distância focal da lente e reduzindo essa distorção na imagem.
- Desligamento parcial do pós-processamento – Ativar o modo profissional pode ajudar a ajustar manualmente as configurações da câmera do celular. Da mesma forma, o modo ProRAW — formato “cru” das imagens — permite um melhor controle da qualidade da foto. Além disso, é importante desligar recursos automáticos como HDR, filtros de beleza, modo retrato, além dos ajustes automáticos de foco e exposição.



E se você quiser ir além? Mesmo quando aplicamos a técnica fotográfica correta, com iluminação adequada e bom enquadramento, as limitações inerentes aos smartphones impedem que obtenhamos imagens de altíssima fidelidade.
Para contornar — ou melhor, tratar — essas limitações, podemos recorrer a ferramentas de pós-produção. Muitos profissionais chamam isso simplesmente de edição, mas o termo vai muito além de apenas editar fotografias.
De qualquer forma, é plenamente possível usar a pós-produção para extrair mais qualidade das imagens que capturamos. Mas esse será assunto para outra hora.
“You don’t take a photograph, you make it.”
Ansel Adams
